sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Nei Lisboa


Nei Lisboa - O Poeta do Gueto

Previamente conhecido como poeta do gueto, sendo tal reduto o famoso bairro Bom Fim, em Porto Alegre, não existe artista mais identificado com este lugar, como Nei Lisboa.

Idolatrado no Rio Grande do Sul, conhecido no Brasil, mantém um público extremamente fiel na capital gaúcha.

Nascido em Caxias do Sul, veio para Porto Alegre, em 1965 sua identificação com a cidade foi rápida. Recebeu forte influência de um personagem muito importante, seu irmão, Luis Erico - ou Ico- cujo idealismo político foi bastante forte devido à ditadura militar acabou por atuar em organizações de esquerdas, até se tornar clandestino, e posteriormente assassinado pelos órgãos da repressão militar. Foi seu irmão que o alfabetizou e deu toda uma teoria, de esquerda logicamente.

Já aos 16 anos, Nei vai para os Estados Unidos, naqueles programas de intercâmbio estudantil, e passa nesse momento a se dedicar ao violão, compondo sua primeira música, retornado ao Brasil com um inglês perfeito. Após, começa a mostrar suas qualidades na Universidade Federal do Rio Grande do Sul em rodas de som entre amigos. Também, tornou-se freqüentador assíduo da esquina maldita, já que morava no Bom Fim e a faculdade era em frente.

Estreou nos palcos, no Clube de Cultura, em um show chamado Lado a Lado com Augustinho Lincks e Gelson Oliveira, um time forte. Mas sem dúvida nenhuma o grande show dessa época foi Deu prá ti, nos anos 70, o que originou a gíria porto alegrense Deu Prá ti, bem como o clássico do cinema gaúcho de mesmo nome, rodado em super 8. E quem não se lembra da canção de Kleiton e Kledir, “deu prá ti, baixo astral, vou prá Porto Alegre, tchau”?

O show que ficou apenas um final de semana no Renascença é emblemático na carreira de Nei. Foi anunciado durante muito tempo por pichações nos muros da cidade, “deu prá ti, anos 70”. A idéia era mesmo de - basta, final, terminou, acabou, - aqueles de repressão. A partir do espetáculo, seu público começa a crescer e a ultrapassar a barreira do circuito universitário, que era até então o que alcançava.

Em 1980, sua música Prá Viajar no Cosmo Não Precisa Gasolina, alcança o segundo lugar no festival de música da PUC, o badalado Musipuc, e suas músicas começam a tocar na rádio Bandeirante de Porto Alegre, futura Ipanema.

Em 1982 se apresenta no Cio da Terra, em Caxias do Sul, festival de música onde foram reunidas cerca de 20.000 pessoas e mantém contato com músicos de outras partes do país.

No ano de 1983, seu primeiro disco, o LP, Prá Viajar no Cosmos Não Precisa Gasolina foi independente. No ano seguinte através da gravadora Acit lança seu segundo disco Noves Fora e, mais tarde, em 1992, a mesma gravadora lança o CD Eu Visito Estrela, que faz uma compilação dos dois discos lançados.

Chega o ano de 1986, Nei assina contrato com a poderosa EMI-Odeon, no ano seguinte lança Carecas da Jamaica e recebe o prêmio Sharp de revelação. Lança, ainda, Hein em 1988. Esses dois últimos discos foram relançados em CD em 1999.

Em 1993, grava ao vivo no Teatro São Pedro, o disco Amém, primeiro trabalho que foi lançado em LP e CD, pela Som Livre.

Somente em 1998 volta às gravações, após dar um tempo para se dedicar prioritariamente a incursões pela informática, outra paixão além, da música e literatura. Nesse ano, Hi-Fi alcança sucesso, com clássicos que permearam sua juventude, todos em Inglês que foram gravados ao vivo no Teatro São Pedro. Em 2001, lança Cena Beatnik, gravado em estúdio depois de longo tempo, pelo selo Antídoto da Acit.

No ano seguinte ocorre uma grande homenagem: é lançado o CD baladas do Bom Fim pela Orbeat, onde quatorze bandas gravam músicas de Nei Lisboa. Ainda pela Antídoto, em 2003, ocorre o lançamento de Relógios do Sol, e em 2006 de forma independente lança outro álbum: Translúcido, com músicas compostas no computador.

Além disso, Nei também é escritor além de vários artigos publicados tem dois livros lançados: “Um morto Pula a Janela” - pela Artes e Ofícios de 1991 - com relançamento em 2000 pela Editora Sulina. Esse livro foi traduzido para o francês também em 2000, e, sobre o livro Luis Fernando Veríssimo escreveu “A surpresa não é que Nei fez um livro diferente e inventivo como a sua música, e brincou com a linguagem e nos intrigou e nos fez dar risadas. A surpresa é que saiu e voltou no seu romance com a segurança de um velho marinheiro. Também foi denso e engenhoso, como um veterano com sal na barba. Este primeiro livro é tudo que se esperava do Nei Lisboa e o que ninguém podia esperar.” O outro livro, “É Foch!”, - Pela LPM - é uma seleção de textos publicados ao longo de oito anos na imprensa gaúcha, lançado em 2007.

Nei também teve várias músicas suas que serviram de temas em filmes. Caetano Veloso, ouviu, gostou e gravou “Pra te lembrar” que foi trilha em “Meu tio matou m cara” de Jorge Furtado.

No ano de 2006, a cantora carioca Simone Capeto lançou o álbum “Bom Futuro”, interpretando apenas canções de Nei Lisboa.

Sem dúvida, é uma grande história! Isso que Nei praticamente se recusou a ser sucesso nacional quando em 1986, com contrato assinado pela Emi-Odeon, esta queria transformar Nei em sucesso nacional. A idéia era que gravasse uma versão de Hey Jude dos Beatles, para a novela Top Model, sucesso garantido. Infelizmente, Nei não passava um bom momento inclusive com sérios problemas pessoais. A versão prometida seria feita por ninguém menos que Ronaldo Bastos, parceiro de Milton Nascimento. acontece que chegando para as gravações a versão apresentada era de Rossini Pinto, ele não agüentou, e em resumo, Kiko Zambianchi, aceitou e foi sucesso nacional. Ainda nessa época, após uma crítica contra seu trabalho, o jornalista da Folha de São Paulo, André Forastieri recebeu de presente de Nei um pacote de bonzo, comida para cachorros.

Abaixo a letra de Berlim Bom Fim de Nei Lisboa e Hique Gomes, do disco Carecas da Jamaica de 1987, onde critica a invasão da força militar no Bar Ocidente.

Já vejo casas ocupadas
As portas desenhadas
No vergonhoso Muro da Mauá
Os velhos nos cafés
O bar João em plena Keithstrasse
A saga violenta deste parque
O cinza da cidade
Partido Verde ao meio
Cheiros peculiares ao recheio
De um bolo de concreto
Repleto de chucrute e rock’em’roll
E depois da meia noite
A fauna ensandecida do Ocidente
Digitando em frente ao Metropol
Berlim, Bom Fim, Berlim Bom Fim.

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